segunda-feira, 15 de agosto de 2011

fantasmagórica - confissão de suicida

O ar vinha com força, fazia meu cabelo parecer estar em gravidade, para cima e pontiagudo. Era um vento tão forte, que me faltava o ar; era um vento que me engasgava. Meus olhos engoliam a pressa do momento, do fim, pois os segundos pareciam-me eternidade. Eu sofri a angústia e o pavor dos segundos que encerrariam todo o processo da minha desistência vital. Sem volta, me doei ao tempo, me joguei do morro. Naqueles segundos, lentos e sóbrios, fui caindo, como folha seca de árvore. Segundos intermináveis segundos. Tão lentos que na queda pude ainda indagar os motivos de toda a minha vida, e as razões que me levaram até o topo morro, movida pela fragilidade psicológica que me aflingia há tempos e nunca se solucionava. A vida não tinha sentido, e o que eu acabara de fazer menos ainda. Mas não houve tempo para arrependimentos. Confesso que bateu a vontade de voltar o tempo, de parar a vida, de pausar a queda, mas era tarde demais para manter os pés no chão, uma vez que eles já tinham dado o passo decisivo, e já estavam alcançando o próximo chão, o chão para o qual eu havia saltado. Alcancei o chão. Sem dor, sem maiores pesares. Saiu tudo como eu havia planejado, e a minha vida eu tirei. Morri. Levantei, e olhei meu corpo. Estava completamente destruído. Sem matéria hoje vago, transito sem rumo, sem cheiro nem sombra. Não posso tomar água de cachoeira. Não sinto o vento. Os cachorros não me enchergam e os nenéns não brincam mais comigo. Nenhuma borboleta pousa no meu ombro, e não há passarinho que acerte a minha cabeça, até porque não tenho. Não sinto calor, nem frio. Não consigo pegar maçã das árvores e ninguém sorri para mim. Não durmo nem tenho sonhos. Não sonho e não tenho sonhos, porque não tenho vida. Enxergo, mas estou invisível. Escuto, mas estou inaudível. Não tenho mais sorriso. Não sei se isso vai acabar. Não tenho mais os olhos, as portas da alma. Não tenho voz. Eu cometi um suicídio. Sou apenas uma voz muda, um pensamento trancafiado na imensidão, um par de asas sem passarinho, vagando no tempo e no espaço sem prazo nem previsão, e isso … isso é o inferno.

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